quinta-feira, 7 de janeiro de 2010

Torres e eu

Para mim, tudo começa em Torres. Nenhum lugar no mundo me traz tantos benefícios imediatos como essa praia. Minha saída anual de início de janeiro é algo que eu aguardo como criança e me lembro o ano todo. Chego cansada, vinda da capital, de um trânsito enlouquecedor, de uma rotina de muito trabalho e dias quentes. Estaciono o carro na garagem e não o pego mais. Fico no meu apartamento, que é a poucas quadras do mar e da casa dos meus pais, uma rua atrás. Aqui ando a pé ou de bicicleta. É a minha chance de ter contato com a natureza. Faço um ritual todos os dias de manhã, muito cedo, quando caminho no calçadão: inicio essa caminhada na ponte que divide Torres de Santa Catarina e vou até a Prainha. No final, entro na praia pelas dunas de areias ondulantes e salpicadas de capim. Tiro os tênis e caminho pela beira do mar. Gosto de olhar de perto as ondas que agitam as conchas, caranguejos, algas e peixes. Essa é uma hora que tem poucas pessoas na praia e o silêncio é encantador. Como eu aprecio esse silêncio!

Bons tempos

A minha história de amor por Torres é antiga. São 45 anos de veraneio. A casa do Coronel Leal foi uma das cinco primeiras da Praia Grande. Quando eu era criança, nos anos 60, costumava chegar aqui em dezembro e voltar nos primeiros dias do mês de março. Naquela época isso era comum, principalmente para as famílias grandes como a minha, pois sete filhos não é pouca coisa não! Lembro de outras famílias numerosas que também faziam o mesmo e, por consequência natural, todos eram amigos - os Cirne Lima, Chaves Barcellos, Martins Lima, Dreher, Martins Costa, Rigotto, Feijó, Sehbe e Potthoff. Brincávamos soltos, pois era um lugar seguro. Era o nosso território! A programação era intensa e começava pelo toque de alvorada, como nos quartéis, pois meu pai, sendo militar, não abria mão da disciplina nem mesmo no período das férias. Cada um de nós arrumava a sua cama e as suas coisas. Havia uma preocupação permanente com o outro, ou seja, nossa conduta era cuidadosa e respeitosa sempre e nas mínimas atitudes. Cuidar dos irmãos menores, colocar e tirar a mesa, molhar o jardim, faziam parte do nosso dia, assim como comer e dormir bem. Quando íamos à praia, cada um levava a sua planonda, os baldinhos, pás e forminhas. O ponto alto era o exercício que tínhamos que fazer. É que o meu pai, como professor de educação física e esportista ( jogava vôlei) fazia questão dos filhos se exercitarem. As meninas tinham que andar um longo percurso na ponta dos pés para ter pernas bonitas e os meninos faziam carrinho de mão para ter ombros e braços fortes. Depois disso é que era liberado o banho de mar. Na volta para casa, todos lavavam seus apetrechos e colocavam para secar. Um bom banho de mangueira era a hora da baderna, mas sempre num tom adequado. Na minha casa o grito não existia e palavrão eu nunca escutei e por isso não sei falar. As refeições eram momentos de reunião da família, com reza antes de comer para agradecer pelo alimento. Jamais algum de nós ousou criar uma confusão à mesa. Após o almoço havia o toque de recolher para a sesta.. Todos tinham que ir para as suas camas e fazer uma leitura. Por uma hora, ninguém podia dar nenhum piu, sob pena de levar um castigo, pois os adultos queriam um pouco de sossego. Na sala, perto da porta, numa cadeira de madeira torneada, ficava sentada a minha avó por parte de mãe. Ela tricotava para os pobres. A vó Alice era uma figura admirável e participava da vida dos netos sempre querendo ajudar, porém jamais interferindo na educação que os pais davam. Ela era de origem alemã, seu sobrenome de solteira era Fuchs, e casou com o meu avô, um espanhol proprietário da joalheria Ibanhez, uma das primeiras joalherias de Porto Alegre. Católica praticante, fazia parte da congregação da igreja São José, ficou viúva cedo e dedicou a vida para a família e a religião e era uma companhia imprescindível nos nossos veraneios.

Mais um pouco de Torres

Esses dias em Torres geraram essa vontade de relembrar os tantos verões que aqui passei e de tentar definir a minha relação com esse lugar que me faz tanto bem. Aos poucos, irei postando mais lembranças, impressões e fotos antes de voltar à rotina de trabalho.

Nenhum comentário:

Postar um comentário

Observação: somente um membro deste blog pode postar um comentário.